quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Wilco cumprindo tabela

 Créditos: npr.org / Reprodução

Schmilco, décimo álbum do Wilco, nas suas primeiras impressões, parece um esboço, uma demo (sem nenhum demérito). Se assemelha a um rascunho de ideias, boa parte delas no violão, que carecia desenvolvimento, que não ocorreu. Algumas ficaram legais do jeito que foram concebidas, outras não.

Se minha crítica ao The Whole Love (2011) é de que poderia ser um trabalho brilhante se não sofresse do distúrbio do coito interrompido (quando as canções terminavam antes do ápice que se construía), aqui o problema é ainda anterior, é de ejaculação precoce. O prazer rápido, efêmero, está presente nas belas Cry All Day, If I Ever Was a Child, Someone to Lose e Nope. Mas não são canções incríveis, históricas, músicas que te abraçam e que você vai levar pro resto da vida. São legais, que dão ânimo na nova turnê pro grupo, que eles gostarão de tocar, mas que convenhamos, não entram em um top 30 de músicas do Wilco.

Na segunda metade, a maionese desanda, se salvam Shrug and Destroy e Locator. We Aren't the World Safety Girl lembra diversas outras bandas (Josh Rouse então, nem se fala). Commom Sense não dá, amigos. Curto esquizofrenia musical, mas tem coisa que não desce.

As demais são músicas razoáveis, porém esquecíveis. Wilco bateu ponto, lançou outro CD, nota 6. Mas desde Sky Blue Sky (2007), o grupo nunca mais soltou algo avassalador, algum trabalho que de fato nos empolgasse, seja pelo "folk pé na fossa que arrepia" ou pelos diálogos de guitarra mais inesperados.

Desde 2007, são quatro álbuns irregulares com algumas lindas canções e outras longe disso. Mas falta "liga", falta a banda assumir o "foda-se" e tentar arriscar, como no A Ghost is Born (2004) que eu particularmente sou fã, com todos os seus excessos. Faltou sair da zona de conforto e correr alguns riscos. Uma pena.

A banda é boa demais pra se acomodar. Dá até prazer o Schmilco, mas ele é meio broxante.


Ouça aqui Nope:




sexta-feira, 22 de julho de 2016

Radiohead sendo mais contemplativo do que nunca

Reprodução / Internet


Adiei ao máximo escrever sobre A Moon Shaped Pool, novo álbum do Radiohead. Demorei, pois estava imerso no descobrimento de várias bandas latinas, que coincidiu com minha viagem para aquelas bandas. Em seguida, comecei a ouvir este álbum, mas o Radiohead não é um grupo que você escuta por três dias diretos, uma semana e já arrota uma palavra de efeito pra ficar marcada. Até porque é um trabalho em marcha lenta, que carecia também de uma demorada audição.

O grupo possui discos completamente distintos, mas que, na minha concepção, são interligados e sugerem que há um fluxo, mesmo que as coisas não necessariamente corram para o mesmo lado. Trocando em miúdos: o Radiohead sempre se constitui de várias facetas. Era uma no Pablo Honey (1993), The Bends (1995) e OK Computer (1997), outra em Kid A (2000), Amnesiac (2001) e Hail to the Thief (2003), outra em King of Limbs (2011)  e uma próxima a esta, de A Moon Shaped Pool (2016) que dá as mãos para o In Rainbows (2007).

A banda volta a soar como "banda", volta a ser mais orgânica, sem abrir mão de toda a sua (não) musicalidade que se aprofundou no pós-apocalipse de Kid A. Mais um trabalho que é indispensável o uso de fones, para (tentar) compreender as camadas sonoras que constituem cada música, que foi premeditada e concebida sem pressa, sem se esquecer de limpar as gavetas.

Decks Dark é incrível. Há um piano em frenesi, uma guitarra repetitiva. Um coral lindo, e uma outra guitarra sutil no refrão, que é absolutamente indispensável. Daydreaming representaria a saída da caverna do grupo, após os últimos anos, contrastando com o próprio videoclipe da canção, em que Yorke entra em uma caverna, mas a mensagem é que as portas se abrem. Balada que apresenta um certo charme, e também alguma claustrofobia que a difere de tantas outras da banda.

Burn the Witch tem belíssimo vídeo e mais méritos do que parece. Ouça separadamente os arranjos orquestrados, o baixo, os violinos. Construção complexa e resultado interessante. Glass Eye se destaca com os arranjos orquestrados que complementam a letra melancólica. Identikit também chama a atenção pelas vozes entrelaçadas, a guitarra ora simples (quando aí o baixo rouba a cena) e  também tomando à frente da canção, digna de um.. Solo de guitarra.

A mesma regra em The Numbers. Nada empolga, mas prende a atenção, pelas sutilezas e suas decorrentes construções. Uma percussão que quase lembra samba, violões que se entrelaçam e vozes de todos os lados pontuam a calma Present Tense.

Tinker Tailor Soldier Sailor Rich Man Poor Man Beggar Man Thief se salva com a orquestra, no fim. E True Love Waits, já é uma velha conhecida, que ganhou forma e corpo, para se revelar bela como sempre foi.

Não é, nem de longe, o melhor trabalho do grupo e definitivamente não é o pior. Mas fica cada vez mais difícil comparar tantos "Radioheads" durante essa trajetória de mais de 20 anos. O que podemos dizer é o que o grupo mais uma vez flerta em soar mais melódico, mais orgânico, mas sem ter a menor pressa. O importante é contemplar, sentar em uma poltrona, deitar na cama e escutá-lo, calmamente.

Imbuído deste espírito, A Moon Shaped Pool cresce. Recheado de detalhes, construções rítmicas, camadas sonoras, ele não encanta, mas convence.

Assista ao videoclipe de Daydreaming:





quarta-feira, 23 de março de 2016

Iron Maiden faz um show digno e alegra gerações

Crédito: Alexandre Bastos / G1

Sou um metaleiro tardio. Desde moleque sempre curti Black Sabbath e Metallica, mas nunca me aprofundei muito no estilo. Até escutar e gostar bastante de The Book of Souls, recente álbum do Iron Maiden. Aí resolvi escutar tudo e me surpreendi com a qualidade dos trabalhos, principalmente na década de 80. Grandes álbuns.

Mea culpa feita, vamos aos fatos. Não me incomodo do grupo fazer uma turnê do último álbum e tocar algumas faixas dele (foram cinco, acho), ainda mais sendo um trabalho legal. Acho que tem que ser assim e não apenas ficar revivendo o passado. Mas sim, me incomoda a banda abrir mão de alguns hits, como Run to the Hills e Can I Play with Madness?. Fizeram muita falta. Poderiam esticar um pouco o setlist de 15 músicas.

O ginásio Nilson Nelson estava lotado. Um calor absurdo, chegando ao ponto de ficar desagradável. Uma sauna. A acústica, como já era de se esperar, era lamentável. Fiquei na pista, perto da mesa de som e ali estava menos ruim. O Iron Maiden merecia um local melhor. E o público também. A única vantagem é que, ao contrário do Mineirinho, o ginásio não é tão grande, então de qualquer lugar, da pista ou arquibancada, o palco está próximo.

Vários ambulantes vendendo pipoca, hot dog e churros. E não vendiam nada. Já para comprar cerveja, sempre uma fila de uns 10 minutos. E alguns lugares aceitavam as fichas e pasmem, em outros não, precisava usar dinheiro. Então, para que raios existem as tais fichas?

Atenção produtora: creio que não deve ser o primeiro show de metal que vocês fazem, então vou explicar o óbvio: roqueiro/metaleiro vai no show pra beber. BEBER. Ele come? Sim. Na saída do show, um sanduíche, churrasquinho ou hot dog no primeiro podrão suspeito que ele encontrar. Em alguns lugares faltou cerveja e quando o estoque era reposto, ela estava quente. Beber uma latinha de Budweiser QUENTE que custava 10 reais dói na alma. E no bolso.

Apesar dos pesares, foi um ótimo show. Bruce Dickinson conseguia alcançar as notas mais altas, mas não conseguia sustentá-las, mas considerando a idade e o fato de que ele venceu recentemente um câncer na boca, estamos todos no lucro.

E pela primeira vez, não comprei uma camiseta, como faço em todos os shows. R$ 120 ficou bem acima de um valor razoável para um fã. Mas apesar dos pesares, o saldo é positivo.

E sobre o Anthrax, o show foi muito curto (30 minutos, mais ou menos), mas eu gostei bastante. E também gostei do comportamento do público, mais preocupado em curtir o show do que nas selfies. E muitas famílias, fazendo o metal passar adiante por gerações. O metaleiro é fiel.

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Ao David

Créditos: nafuma.com.br / Reprodução

Demorei a escrever, esperei a ficha cair. Não cai. A morte do David, mesmo assimilada, ainda é de difícil aceitação. Sim, do David. Me senti como se tivesse perdido alguém da família, um amigo próximo.

Isso nunca me ocorreu. Nunca fui um fã apaixonado, apesar de sempre acompanhar sua carreira com atenção e gostar de muita coisa em sua discografia, principalmente a década de 70 e início de 80, que são absurdamente bons. Mas a morte dele bateu. Doeu. Dói.

Talvez por tudo o que ele representa não só na música, mas como artista. Da gama absurda de gente que ele influenciou, das mais variadas vertentes e raízes musicais. Das pessoas que percebi que estavam de fato sofrendo, chocadas, pois a arte que ele fez encurtava distâncias, driblava culturas e fazia significado para qualquer um de nós.

Da sua carreira em si, sempre surpreendente, sempre tentando algo novo e diferente, mesmo errando. Um incomodado, um desbravador, um monstro, que deixou canções e mais canções na história.

A sua despedida foi premeditada. Terminar um álbum com seis paradas cardíacas no período é um sintoma óbvio de que aquele era seu último tiro. Seu último suspiro. Felizmente, ele o completou e deixou dois videoclipes lindos, repletos de mensagens a respeito da sua morte (já tentei fazer uma análise semiótica, é coisa que dá trabalho e que até me falta conhecimento).

Nada ali é por acaso e ele deixou sua mensagem, se despediu sem alarde e deixou que o rebuliço ficasse por nossa conta. A incredulidade, a tristeza e a emoção de uma despedida tão significativa, encerrando uma carreira tão bonita, com seus altos e baixos, mas sempre apontando adiante, à frente do seu tempo, influenciando a música, a moda, o cinema, o comportamento e tudo o mais que fosse possível.

Jamais haverá outro David como o Bowie. O talento dele era do nível dos maiores que por aqui já estiveram e estão. A música vai perdendo a graça, a cor. É passar o legado dele adiante, para que mesmo morto ele continua vivo para nós.

Este clipe é incrível, repleto de referências da sua morte, que estava próxima. O álbum inteiro, desde o nome, até sua arte, foi brilhantemente pensando a este respeito. Até no crepúsculo da vida, David Bowie foi genial e decidiu sê-lo após partir da Terra. Só temos que aplaudir e reverenciar.