quarta-feira, 28 de maio de 2014

Coldplay pisa no freio e não esboça pressa em arrancar


É engraçada a marcação de muitas pessoas (não só da crítica) com o Coldplay. No início, reclamam que era arrastado e chorão. Depois, que ficou pop demais. Agora, certamente vão arrumar defeito em Ghost Stories, sexto álbum que chega hoje nas lojas.

E o Chris Martin dá motivos para reclamarem, mas calma, chegaremos lá.

Primeiro, uma certa defesa contra os críticos (não total). Parachutes, lá de 2000, é um álbum enxuto, certinho, com pérolas que retratam uma banda iniciante, que adora(va) Travis e queria ser alguém ali no cenário do pós-britpop, nada muito além.

Com a A Rush of Blood to the Head, as vendas dobraram mundo afora e os horizontes musicais do grupo se expandiram, mesmo sendo um álbum que brilhou mais pelos singles do que pelo conjunto.

Em X & Y veio a derrapada em virtude de uma produção exagerada com teclados e sintetizadores em excesso, acima de tudo e todos, como um "sintoma de Phil Spector em The Long and Winding Road dos Beatles". Fix You sempre será uma das mais belas músicas daquela década, o álbum tem seus méritos, mas no geral, não convence muito.

Aí mudam completamente a direção: o céu se abre, o sol aparece, luzes e muitas cores. O carnaval sonoro da banda entra na avenida, expandindo seus horizontes: Viva La Vida e Mylo Xyloto venderam muito, mas aquém dos anteriores (10 milhões e 8 milhões respectivamente, sendo que X & Y e  o A Rush... venderam 15 milhões cada). Não sei se a derrocada da indústria motivou, mas ao menos aqui no Brasil, o público cresceu nestes dos últimos trabalhos, mais plurais. E com hits magníficos e flertando descaradamente com o pop (principalmente no último trabalho).

O Coldplay ainda soava introspectivo em alguns momentos, mas escancarava sua música para um público maior. E agora pisaram no freio. Ghost Stories é fechado, com alguns breves acenos mais populares. Algumas vezes o álbum soa "lounge", mas reflete um momento de ruptura, talvez pelo fim do relacionamento do vocalista, que norteia o conceito do disco.

Rupturas amorosas geralmente se refletem na arte produzida. No caso do Coldplay, foi uma ruptura e tanto: eles voltaram a soar mais melancólicos e introspectivos, mas sem a mesma verve dos primeiros anos. Grande chance de ser o álbum que menos vai vender deles. Mas aí surge a pergunta. É bom?

Sim, mas cai no rol dos famosos "álbuns de transição" dos críticos, que seria algo como a "virose" para os médicos. Deve-se aguardar para saber aonde o Coldplay vai parar, para fomentar melhor uma identificação. Se é que vai parar em algum lugar. Neste momento, percebe-se um álbum climático, com muitas nuances eletrônicas e pouca bateria e guitarra.

Magic é uma bela música, mas contrasta com os singles alegres de outrora. A única tentativa de soar de forma festiva está em A Sky Full of Stars, mas que soa estranha, como se fosse uma música calma que foi remixada por uma rádio "para a noite, para a balada", coisa que a própria banda já sofreu inúmeras vezes. Mas dessa vez eles mesmos produziram, de forma proposital. A última, O, esta sim, remete aos primórdios do Coldplay: se é uma arrancada em marcha à ré para suas fraldas ou apenas um momento turbulento de seu líder, o tempo irá nos dizer.

Nas demais, as canções soam comportadas: Always in My Head é quase um lounge. Midnight, esta sim, é um lounge.  True Love e Ink são belas e meramente contemplativas. Another's arms é quase um trip hop.

Ao final, o álbum pode soar chato para os mais apressados. De fato, não será um trabalho de referência do grupo, um ícone da sua discografia, mas mesmo assim merece uma audição atenta. Mas não, não entra no top 3 deles, mas vale a pena escutar, sem pressa, palavra que não está no vocabulário do grupo, que concebeu este rebento em quase 3 anos. Portanto, recomenda-se parcimônia.

Assista abaixo ao videoclipe de Magic:


segunda-feira, 19 de maio de 2014

O novo Titãs é velho, mas vale como uma goteira no semiárido

Faça um breve exercício. Pegue as bandas de rock nacional dos anos 80. Quais continuam produzindo, gravando algo com regularidade e qualidade? Pois é, nenhuma. Barão Vermelho, Kid Abelha, Engenheiros do Hawaii, Ira! seguem em hiato. Algumas fazem breves retorno$ e logo somem. Legião Urbana é história. O Ultraje a Rigor se destaca mais pelos tweets de política do seu vocalista. E os Paralamas, não produzem algo memorável há uns 15 anos. Talvez isso explique porque o rock nacional, que andava fatigado nos dials acabou sumindo completamente.

Mas enfim, é outro papo. O débito dos Titãs é maior. Lembro claramente deles lançando Domingo e se apresentando no Faustão. Foi o último suspiro de criatividade da banda (avaliação que cresceu motivada pelos horrores que lançariam posteriormente). Veio o (belo) acústico, que fomentou nos caça-níqueis posteriores, que vou poupá-los dos adjetivos negativos: Volume 2 e As Dez Mais. Após esse período, discos autorais insossos, com talvez um single que valha a pena aqui e outro acolá (como Epitáfio e Isso). É pouco, bem pouco.

Nheengatu, o novo álbum me deixa em uma encruzilhada. Ao mesmo tempo que aplaudo um direcionamento mas ríspido, rock e contundente do grupo, sua própria história depõe contra. Uma banda que sim, contestou, bateu de frente e mandou o mundo às favas em Titanomaquia ou Cabeça Dinossauro é a mesma que fez discos bem contraditórios nos últimos anos, abrindo mão de convicções, história e pensando na grana. É do direito deles? Claro! Mas aí, fica difícil colar esse discurso de "protesto" do novo trabalho, parece apenas um adesivo no "case" de guitarra. Uma ocasião, um momento. Ou um roqueiro de boutique, que vive confortavelmente em bairro de classe média e posa de revoltado.

Nem entro no mérito de "senhores de idade querendo soar jovens", pois o rock não envelhece no espírito. Acho absolutamente louvável e natural bandas após muitos anos ainda quererem e/ou tentarem resgatar o som de outrora, pois isso ainda contribui para perpetuar o rock, que está cada vez mais segmentado e desnutrido. Ainda ouço os novos discos dos "dinossauros" e acho que ainda podem contribuir com a música. Esse papo de que música/protesto/atitude é pros jovens talvez cole melhor nos ícones pop, pois ali realmente a imagem conta até mais que a própria música. Não no rock.

Então, ouvir um disco de rock dos Titãs, resgatando a acidez e o discurso (com letras meramente medíocres, mas comparando com o que se faz hoje no rock nacional, soa como poesia floreada) é legal.
Mas para mim é um mero entretenimento, não me convence, não caio nesta cilada.

Mas ó, prefiro eles tentarem revisitar o passado e soando repetitivos do que inovarem e fazer lixo. Ao menos, há vigor no álbum, E ótimas guitarras. Temas espinhosos, fúria e cinco músicas legais: Fardado, Mensageiro da Desgraça, Chegada ao Brasil, Não Pode e Quem São os Animais? (esta, a melhor). Para um fã antigo, não surpreende. Mas pode despertar o gosto pelo rock nacional nas novas gerações, tão castigadas com os Detonautas da vida. Neste sentido, este trabalho presta um grande favor. Quem sabe eles tocam no "Exquenta" da Globo? Melhor uma banda de rock fazendo uma releitura do que já fez do que a mesmice dominical, certo?

Enfim, é um disco que leva nota máxima no intuito, no pálido resgate do que já fizeram e na válida tentativa de "manter a chama do rock acesa" (termo horroroso, mas enfim). Mas ao final, por tudo isso que já escrevi nestas linhas, que você está de parabéns em suportá-las, leva nota positiva, mas sem aclamação. Passaram de ano e fizeram um álbum digno. E só.

Mas os clássicos ainda são (e creio que sempre serão) insuperáveis. Mas tomara que a grande mídia os aceite de volta, agora. Seria de grande utilidade para o rock nacional não morrer (sem mais clichês, por favor).