sábado, 27 de maio de 2017

Um brinde à música de Mendoza



Créditos: Joaquín Brito / Divulgação

Uma das cidades que quero conhecer é Mendoza, na Argentina. Não, esse não é um post sobre turismo, mas se alguém quiser dicas, eu posso ajudar, pois já até planejei a viagem, mas como um típico jornalista, não sou muito bom com números. E errei nas contas, portanto meus planos de conhecer essa aprazível cidade aos pés dos Andes, foi adiada para no sé cuando.

E naquelas ironias que as redes sociais me proporcionam, acabei voltando, de certa forma para cidade e agora tenho mais razões para conhecê-la: a música.  Estava eu, navegando no Spotify, ouvindo os “artistas relacionados” de outros músicos que gosto. Essa é uma viagem sem fim, sabemos. E logo apareceu para mim uma banda chamada Perras On The Beach. Cidade? Mendoza. Só um trabalho lançado, que se chama Chupalapija. Sim, a tradução é essa que você imagina. Bom ressaltar que nossos hermanos, felizmente, têm muito menos pudor/recalque para dizer essas palavras, carajo.

Entrei na página do Facebook deles, vi que o grupo é formado por garotos entre 16 e 22 anos e que gravaram e produziram o primeiro trabalho, em apenas três dias. Ouvindo o disco, percebi realmente um lado tosco, mais no sentido de ser rústico, de ter um grande potencial, mas que ainda não foi bem desenvolvido, mas que há boas ideias ali. 

Mas não, meu texto não é sobre eles. É porque na página do Facebook, eles postaram um vídeo no Youtube do novo álbum do Usted Señalemelo. Vi que são dois discos. Comecei a escutar o primeiro disco ainda nesta semana e achei incrível. De onde eles são? Sim, Mendoza.

No primeiro trabalho, o grupo ora se apresenta com um indie rock bem jovem e ensolarado, tipo Phoenix e Foster the People (porém, melhorado) e em algumas outras ocasiões flertam com um pop-rock mais adulto, trazendo boas referências locais, como Gustavo Cerati. Nas primeiras audições, já ia selecionando as músicas para as minhas listas do Spotify, tamanha foi minha surpresa. 

Li matérias que diziam que essas músicas eles tocavam desde adolescência, portanto o primeiro registro Usted Señalemelo, apesar de lançado em 2015, tinha uma certa vibe que remetia a 2011 e 2012, uma celebração da adolescência. Um bom trabalho, mas basta escutar uma vez pra gostar de cara ou não. Simples, direto e bem feito. Vá escutando Plastilina, Cristales, Alfredo, Outra Vez, Girando a Través... Você gosta, ou desgosta de vez. A ótima Textos e a balada Água Marfil  já mostravam um amadurecimento, entregando o que estava por vir. Porque a coisa cambió. E muito.

A discrepância para II, lançado há pouco, é significativa. A banda dá alguns passos adiante e faz o début ser apenas uma boa estreia juvenil. O novo é mais complexo, instigante e bem menos comercial. A banda envelheceu 10 anos em 2. Esquece Phoenix, videoclipes ensolarados em piscinas curtindo el verano. Muitas texturas, orquestrações, flertes eletrônicos, alguma sonoridade dos anos 80, levam o grupo para outra direção e surpreende o ouvinte por tamanho ecletismo. Big Bang é excelente e você se perde na enxurrada de influências. Aguetas é climática e ao mesmo tempo, dançante.  Laser 420 é psicodélica. F.T., majestosa, um flerte com Verve e Manic Street Preachers. O trabalho se encerra com as barulhentas e boas Tu Salto e Puedo Morir, Puedo Caer.

Agora já sei: quando for a Mendoza, beberei os vinhos, subirei os Andes e também, tentarei ver um show dos caras por lá. Uma grande surpresa, de uma banda ainda promissora. Vale muito a pena conhecer.

Abaixo, confiram Plastilina, música do primeiro álbum deles:




sexta-feira, 7 de abril de 2017

Kamasi Washington celebra a música além dos rótulos





No estonteante Theatro Municipal do Rio de Janeiro, Kamasi Washington e sua trupe fizeram um show no qual adjetivos não são suficientes para descrever a magia de testemunhar essa apresentação. Não se trata apenas de jazz, na verdade foi uma celebração musical, em que rótulos até podem ser colados, mas deslizam como ímã na madeira.

Foi um show de jazz, sem dúvidas. Foi de rap também? Sim. Teve gente batendo cabeça em alguns momentos, como se fosse um show de heavy metal? Sim. Teve suingue, groove? Demais. O que então dizer?

Quando em Re Run, ocorre um "duelo" do DJ e seus scratches com o percussionista Leon Mobley tocando conga, o grupo deixou claro que não há disputa: o “novo” e o “tradicional” podem coexistir perfeitamente e o resultado, é incrível. 

As expectativas já eram altas, mas o show surpreendeu exatamente pelas improvisações destas dez pessoas no palco que reconstruiram suas músicas. A plateia, atônita e embasbacada, foi uma refém passiva nas 2 horas de show e ao final, reverenciou, de pé.

A opção de trazer apenas um tecladista, Brandon Coleman (que muitas vezes pareciam ser dois) e além das duas baterias, contar com um percussionista, fez o show ficar menos climático e mais percussivo, mais pesado, deixando as canções ainda mais enérgicas, como The Rythm Changes, Askim, Change of Guard e Henrietta Our Hero (que ele explicou ser uma homenagem para a avó, antes de chamar o próprio pai Rickey Washington ao palco, para tocar flauta e clarinete).

Não dá para explicar o que foi esta apresentação. Show do ano, uma das performances mais incríveis que todos ali que lotaram o teatro testemunharam. Ao final, avisou que estaria no camarim para receber e conversar com os fãs. Mas minutos depois, voltam ao palco para o bis e recriam Final Thought, mas em uma versão bem mais veloz e voraz. Se divertem, claramente. O resultado é absurdo.

Kamasi Washington faz jazz para quem não gosta de jazz e também para quem gosta, ao mesclar e modernizar o estilo sem abrir mão de suas tradições, mas sempre olhando à frente, sendo ousado e surpreendente. Este é o show para ser visto e aplaudido neste ano e que está além das vãs tentativas de ser adjetivado. 

Abaixo, o bis com Final Thought