segunda-feira, 19 de maio de 2014

O novo Titãs é velho, mas vale como uma goteira no semiárido

Faça um breve exercício. Pegue as bandas de rock nacional dos anos 80. Quais continuam produzindo, gravando algo com regularidade e qualidade? Pois é, nenhuma. Barão Vermelho, Kid Abelha, Engenheiros do Hawaii, Ira! seguem em hiato. Algumas fazem breves retorno$ e logo somem. Legião Urbana é história. O Ultraje a Rigor se destaca mais pelos tweets de política do seu vocalista. E os Paralamas, não produzem algo memorável há uns 15 anos. Talvez isso explique porque o rock nacional, que andava fatigado nos dials acabou sumindo completamente.

Mas enfim, é outro papo. O débito dos Titãs é maior. Lembro claramente deles lançando Domingo e se apresentando no Faustão. Foi o último suspiro de criatividade da banda (avaliação que cresceu motivada pelos horrores que lançariam posteriormente). Veio o (belo) acústico, que fomentou nos caça-níqueis posteriores, que vou poupá-los dos adjetivos negativos: Volume 2 e As Dez Mais. Após esse período, discos autorais insossos, com talvez um single que valha a pena aqui e outro acolá (como Epitáfio e Isso). É pouco, bem pouco.

Nheengatu, o novo álbum me deixa em uma encruzilhada. Ao mesmo tempo que aplaudo um direcionamento mas ríspido, rock e contundente do grupo, sua própria história depõe contra. Uma banda que sim, contestou, bateu de frente e mandou o mundo às favas em Titanomaquia ou Cabeça Dinossauro é a mesma que fez discos bem contraditórios nos últimos anos, abrindo mão de convicções, história e pensando na grana. É do direito deles? Claro! Mas aí, fica difícil colar esse discurso de "protesto" do novo trabalho, parece apenas um adesivo no "case" de guitarra. Uma ocasião, um momento. Ou um roqueiro de boutique, que vive confortavelmente em bairro de classe média e posa de revoltado.

Nem entro no mérito de "senhores de idade querendo soar jovens", pois o rock não envelhece no espírito. Acho absolutamente louvável e natural bandas após muitos anos ainda quererem e/ou tentarem resgatar o som de outrora, pois isso ainda contribui para perpetuar o rock, que está cada vez mais segmentado e desnutrido. Ainda ouço os novos discos dos "dinossauros" e acho que ainda podem contribuir com a música. Esse papo de que música/protesto/atitude é pros jovens talvez cole melhor nos ícones pop, pois ali realmente a imagem conta até mais que a própria música. Não no rock.

Então, ouvir um disco de rock dos Titãs, resgatando a acidez e o discurso (com letras meramente medíocres, mas comparando com o que se faz hoje no rock nacional, soa como poesia floreada) é legal.
Mas para mim é um mero entretenimento, não me convence, não caio nesta cilada.

Mas ó, prefiro eles tentarem revisitar o passado e soando repetitivos do que inovarem e fazer lixo. Ao menos, há vigor no álbum, E ótimas guitarras. Temas espinhosos, fúria e cinco músicas legais: Fardado, Mensageiro da Desgraça, Chegada ao Brasil, Não Pode e Quem São os Animais? (esta, a melhor). Para um fã antigo, não surpreende. Mas pode despertar o gosto pelo rock nacional nas novas gerações, tão castigadas com os Detonautas da vida. Neste sentido, este trabalho presta um grande favor. Quem sabe eles tocam no "Exquenta" da Globo? Melhor uma banda de rock fazendo uma releitura do que já fez do que a mesmice dominical, certo?

Enfim, é um disco que leva nota máxima no intuito, no pálido resgate do que já fizeram e na válida tentativa de "manter a chama do rock acesa" (termo horroroso, mas enfim). Mas ao final, por tudo isso que já escrevi nestas linhas, que você está de parabéns em suportá-las, leva nota positiva, mas sem aclamação. Passaram de ano e fizeram um álbum digno. E só.

Mas os clássicos ainda são (e creio que sempre serão) insuperáveis. Mas tomara que a grande mídia os aceite de volta, agora. Seria de grande utilidade para o rock nacional não morrer (sem mais clichês, por favor).